O cenário, com a parada dos B737MAX8



O problema da paralização mundial da frota de B737MAX8, vai muito além da questão da solução para o software do MCAS, pois ele traz também no seu bojo, discussões éticas, de treinamento, de testes para certificação, custos para a indústria do setor aeronáutico comercial, bem como e principalmente, no meu modo de ver, enfrenta questões políticas e comerciais, que envolvem os EUA, Europa e China, cada um com sua preocupação em proteger a própria indústria. Por esse ponto de vista, não é uma coisa simples de se resolver, pois extrapola o ambiente da indústria aeronáutica.

Entretanto, vejamos primeiramente crises análogas, que se deram no passado.

Não foi a primeira vez. que o setor sofreu com acidentes envolvendo aviões recém lançados. Entre fevereiro de 1959 e março de 1960, três Electras novinhos em folha, sofreram acidentes fatais, com uma enorme repercussão e que são inclusive lembrados até hoje. No entanto, o avião que resultou das investigações e melhorias a partir da experiência de tais acidentes, tornou-se uma das aeronaves mais seguras de todos os tempos.

O próprio Boeing 727, de reconhecido sucesso e uma das aeronaves mais vendidas no mundo e em operação até os dias de hoje, sofreu três acidentes fatais em 1965, menos de três meses depois de seu lançamento comercial, no ano de 1964. Foram dois da United e um da American, com esse número aumentando para quatro em menos de seis meses, com a queda de um 727 da ANA, na aproximação para Haneda em Tókio e pior ainda, subindo para cinco em menos de quinze meses, com o acidente da Pan Am, na Alemanha.

Só para contextualizar, o acidente com o ANA, foi na época, o maior acidente em número de vítimas fatais, da história da aviação comercial no mundo até então, com um total de 133 mortos.

Claro, que no 737MAX8 a questão é gravíssima, principalmente em se tratando do número de perdas de vidas humanas, que somaram 346 nos dois acidentes. Foram 189 no Lion Air 610 e 157 no Ethiopian 302.

No caso dos 737MAX8, a questão inicial do problema, está no tamanho maior dos novos motores, que a princípio aumentam o risco de stall, quando do aumento no ângulo de ataque, o que por óbvio, já se dá nas primeiras fases do voo, portanto, a baixa altura, com pouco ou quase nenhum tempo de recuperação.
O sistema automatizado de controle de voo do MAX, conhecido como MCAS, parece ter desempenhado um papel central nos acidentes do vôo 610 da Lion Air e do 302 da Ethiopian Airlines.

Acho, que aqui se inicia a questão comercial, aliada é claro, à preocupação com a segurança de voo.

A China se apressou em colocar no chão toda sua frota de 737MAX, imediatamente após o acidente do 302, por determinação da sua agência reguladora, a CAAC, que imediatamente foi seguida por outros países, o que forçou a FAA a tomar a mesma atitude.

O impacto é enorme, não se comparando de nenhuma forma, ao impacto da parada dos 787, quando houve o problema das baterias, pois naquela oportunidade, 50 aeronaves foram "groundeadas", sendo que agora, são 400 aeronaves 737MAX8 no solo, em todo o mundo. É evidente, que o impacto é imenso, principalmente porque no caso dos 787, não houve vítimas fatais, apenas os incidentes das baterias, causando somente prejuízos financeiros.

As perguntas que não se calam são: por quanto tempo o MAX ficará fora de serviço e quais serão os resultados para o mercado?

O setor aéreo espera, que o MAX volte logo, já com o problema sanado, correções de software, treinamentos, boletins, etc., mas não é tão simples assim.

Ainda que a Boeing entregue a correção do MCAS à FAA, para sua aprovação e considerando, que a mesma seja aprovada, tanto a EASA (agência europeia de segurança da aviação), quanto a CAAC (agência chinesa), têm o seu tempo,para avaliação e aprovação. A EASA, por padrão já é bastante criteriosa, mas a CAAC, além da preocupação com a segurança, foi a primeira a determinar o "groundeamento" dos MAX8.

Não há como nos esquecermos, de que a CAAC é uma agência controlada pelo governo chinês, que tem grandes planos de mercado para o Comac C919.

Podemos dizer, que o cenário não está muito a favor da Boeing, no sentido de voltar a operar os 737MAX8, ainda no mês de abril.

Tanto a EASA, quanto a CAAC, podem determinar, que testes adicionais de voo sejam feitos, para permitir ou não, que os MAX8 entrem novamente em serviço e isso, sem dúvida alguma pode atrasar em muito, o retorno destes aviões aos céus.
Podem ser exigidos também, treinamento adicional para as tripulações e técnicos.

Mas no caso da China, existe ainda um outro complicador, que é a questão da briga comercial, entre EUA e China. O retorno do 737MAX8, poderia perfeitamente entrar, como moeda de troca, ou negociação, entre os dois países, restando saber, se a China o faria. A conferir.

Tem a questão da venda dos F-16 para Taiwan, que é outra pedra neste sapato, além disso, a China fez uma encomenda de 300 jatos Airbus, sendo 290 A320NEO. Para piorar mais ainda o cenário, a opinião pública indonésia pode ter contribuído para a tentativa da Garuda, de cancelar um pedido de 49 737MAX8, num total avaliado em US$ 4,9 bilhões. Nos EUA o Departamento de Justiça intimou a Boeing como parte (indiciada) de uma investigação criminal. Todas essas coisas juntas, podem atrasar muito o retorno global do 737MAX, para cerca de 9 a 12 meses ou até mais.

Com o cenário da expectativa da volta do MAX8 aos céus desenhado acima, tratemos da segunda questão proposta, a respeito do impacto na indústria e quais serão os resultados para o mercado.

O primeiro é o impacto financeiro, que acontece na própria Boeing. Segundo Ron Epstein, do Bank of America Merrill Lynch, cada três meses de parada dos 737MAX, significa para a Boeing um peso de US $ 5,5 bilhões em seu balanço.


É muito difícil ver a Boeing lançando um novo avião de médio porte sob essas circunstâncias. Um outro problema muito sério, é a situação enfrentada pelos fornecedores da Boeing, pois precisam tomar suas decisões estratégicas, sem saber ao certo o que esperar pela frente. O que faz a Boeing? Adota um cenário otimista, que sonha com o retorno dos 737MAX8 em dois meses, ou seja, em abril, ou reduz os pedidos aos seus fornecedores para economizar capital?


Como podemos concluir, as condições de voo estão muito mais turbulentas aqui no chão, do que no céu, para o Boeing 737MAX8.

Vamos torcer, para que encontrem o mais breve possível, a solução para o retorno seguro aos céus, do B737MAX8

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